Manifestação na terça-feira (14/10), na Assembléia Legislativa de São Paulo e na sexta-feira (17/10), na Avenida Paulista, reunirá defensores e movimentos sociais
Os Defensores Públicos do Estado de São Paulo estão prontos para realizarem uma paralisação de suas atividades entre os dias 13 e 17 de outubro, em todo o Estado. Ainda haverá uma reunião da Assembléia Geral da categoria na próxima sexta-feira (10/10) para que a paralisação seja confirmada em definitivo.
A Defensoria Pública presta assistência jurídica integral e gratuita, no âmbito extrajudicial e judicial, àqueles que não têm condições financeiras de pagar um advogado sem prejuízo da sua própria subsistência ou de sua família. Seu público alvo é, portanto, a população de baixa renda de todo o Estado, cuja renda familiar não ultrapasse três salários mínimos.
A assistência é prestada em diversas áreas do Direito: civil, família, infância e juventude, consumidor, ambiental, criminal e execução penal. A Instituição não se limita, no entanto, às defesas em processos judiciais. Ela também atua na promoção da cidadania através da educação em direitos e a mediação de conflitos.
Um exemplo sintomático da situação dramática pela qual vem passando a Instituição no Estado são os números referentes à situação carcerária. São Paulo possui um terço dos presos do país, mas apenas 35 defensores públicos atuam na assistência ao presidiário, em todo o Estado. “São muitos os presos que já cumpriram pena ou teriam direito a benefícios previstos por lei, mas continuam lotando os presídios por falta de defesa jurídica”, diz Juliana Belloque, presidente da Associação Paulista de Defensores Públicos (APADEP). A lei que instaurou a Defensoria Pública em São Paulo (988/06), diz que a Instituição deve ter sala própria em cada estabelecimento penal. No entanto, não há sequer 1 Defensor Público atuando permanentemente dentro dos presídios.
Números que não mentem
A situação da Instituição também é dramática no que se refere ao atendimento à população carente, principalmente no interior de São Paulo. 93% dos municípios do Estado não possuem uma Defensoria Pública instalada. Das 360 comarcas, apenas 22 possuem defensores atuando. A região mais pobre, por exemplo, o Vale do Ribeira, não há nenhum defensor público trabalhando. Em todo o Estado, são 400 profissionais e a proporção é de um defensor para potenciais 58 mil usuários. No Rio de Janeiro, essa proporção é de um para aproximadamente 14 mil usuários e 100% dos municípios possuem Defensoria.
Além do número insuficiente de defensores, a defasagem salarial entre as carreiras jurídicas é incompreensível. A Constituição de 1988 diz que Juízes, Promotores e Defensores Públicos ostentam mesmo status constitucional, inclusive estando vinculados a idêntico teto salarial. No entanto, no Estado de São Paulo, a Magistratura possui 2.229 profissionais, o Ministério Público 1.700 e a Defensoria Pública 400. E a remuneração dos defensores é quase 4 vezes menor do que a remuneração de juízes e promotores de Justiça. A defasagem acaba ocasionando problemas estruturais na Instituição. Esse quadro provocou a evasão de 58Defensores Públicos em 1 ano, que procuraram as carreiras jurídicas melhor remuneradas. O número representa quase 15% da carreira.
A nível nacional, em comparação com outros Estados que possuem Defensoria Pública, a defasagem salarial também é alarmante. O Estado de Alagoas, por exemplo, que possui a menor renda real média e a maior proporção de pobres do Brasil, paga um inicial de R$ 17.251,46 ao defensor público. Já São Paulo, Estado mais rico da nação, responsável por 31% do PIB nacional, o valor é de R$ 5.045,00. Se a referência for a longevidade da criação das Defensorias Públicas nos Estados, a de São Paulo foi criada apenas em 2006, tratando-se, portanto, de uma carreira nova. No entanto, se compararmos com a Defensoria do Estado de Mato Grosso do Sul, criada um ano antes, em 2005, o salário inicial é de R$ 11.000,00. O número equivale a mais do que o dobro do que o Estado “motor” do Brasil paga àqueles que defendem a população carente.
Proposta orçamentária para 2009 mantém desvalorização dos últimos anos
A previsão orçamentária do Poder Executivo, seja ele federal, estadual ou municipal, determina a linha das políticas públicas da administração. Não à toa, o sistema de Justiça (Magistratura, Ministério Público e Defensoria Pública) é um dos pontos mais importantes desta previsão.
Um exemplo claro da desvalorização da Defensoria Pública é que a verba destinada prevista pelo Tesouro do Estado, em relação a todo o sistema de justiça, no orçamento dos últimos três anos, não chega a 1%. Em 2007, o valor foi de 0,75%. Em 2008, de 0,78% e o de 2009, se aprovado na Assembléia Legislativa, será de 0,9%.
A previsão orçamentária do Governo do Estado de São Paulo para o ano de 2009 foi enviado à Assembléia Legislativa recentemente. Dentre os valores destinados ao sistema de Justiça, o Tesouro do Estado destinará aproximadamente 53 milhões à Defensoria Pública. Somando-se a receita vinculada do Fundo de Assistência Judiciária (FAJ), o valor vai para 401 milhões. Porém, deste valor final, no orçamento destinado em 2007, por exemplo, 272 milhões foram destinados ao convênio com a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
“Temos receio de que em 2009 faltará dinheiro para o quadro de apoio da Lei Complementar n. 1.050/08, cujo primeiro concurso, para 120 oficiais, já foi deflagrado”, diz Juliana Belloque, presidente da APADEP.
Paralisação pretende melhorar a assistência jurídica ao pobre
Os preceitos legais para a realização da paralisação de 5 dias serão resguardados. O Supremo Tribunal Federal reconhece o direito à greve dos servidores públicos desde que haja “continuidade na prestação dos serviços cuja falta coloque em risco iminente a sobrevivência, a saúde ou a segurança dos usuários”. É o que será feito. Em todo o Estado, a idéia é manter um sistema de plantão para não prejudicar a população que precisa de assistência jurídica emergencial. “Apenas os casos que gerem risco à vida e segurança dos usuários deverão ser atendidos, havendo orientação de que os demais retornem na semana seguinte”, diz Juliana Belloque, da APADEP.
Independente da decisão de paralisar suas atividades, os defensores públicos realizam uma manifestação na próxima terça-feira (14/10), a partir das 13h, na Assembléia Legislativa de São Paulo. Já na sexta-feira (17/10), haverá um ato na Avenida Paulista, com a participação da sociedade civil, com ponto de partida, às 10h, no vão livre do MASP e ponto de chegada na Rua Bela Cintra, em frente à Secretaria de Gestão Pública, que tem sido o canal de negociação do governo com os servidores.
“O acesso à Justiça é uma forma de diminuirmos a desigualdade social no Brasil e a luta para fortalecer a Defensoria é uma luta de toda a sociedade”, diz Deise Benedito, presidente da “Fala Preta!”, organização de Mulheres Negras. Entre as entidades esperadas para o Ato do dia 17 estão, principalmente, a União dos Movimentos de Moradia, o MST, Movimento Negro, Marcha Mundial de Mulheres, ativistas de Direitos Humanos, além de outros componentes do “Movimento pelo Fortalecimento da Defensoria Pública”, que já realizou uma marcha com mais de 1000 pessoas em setembro pela valorização da instituição.