VII Seminário da ENADEP se encerra com palestra sobre vulneráveis vítimas de políticas financiadas por instituições internacionais

A última palestra do VII Seminário da ENADEP, realizada ao final da tarde desta sexta-feira, 30 de janeiro, fechou o evento com chave de [...]

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A última palestra do VII Seminário da ENADEP, realizada ao final da tarde desta sexta-feira, 30 de janeiro, fechou o evento com chave de ouro. O Defensor Público de São José dos Campos, SP, Jairo Salvador de Souza, trouxe ao público os detalhes de sua experiência na defesa populações vulneráveis afetadas por políticas habitacionais financiadas por instituições internacionais e na promoção do acesso de aos mecanismos de prevenção e solução deste tipo de conflito. Souza abordou, em especial, o caso de uma comunidade Nova Tatetuba, de São José dos Campos, que foi suprimida e sua população removida de forma compulsória e ilegal, dentro de um programa de habitação financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Por este trabalho, Souza foi finalista do Prêmio Innovare.

 

Souza iniciou sua palestra ponderando que é comum falar dos Defensores Públicos como instrumentos de acesso à justiça, sem se questionar que justiça é essa e que tipo de acesso os Defensores estão proporcionando. “Dentro da concepção de que direito e justiça nem sempre andam de braços dados, a atuação “ajudicial” também é importante para se descolar do judiciário”, disse Souza. Neste sentido, ele argumentou que a Defensoria tem o direito de exigir o planejamento de políticas e ações que impactem a vida dos mais vulneráveis. Hoje, segundo o Defensor, quando se considera a estrutura programática de uma política pública (políticas, programas, projetos), a Defensoria tem atuado no âmbito das atividades e dos projetos. Contudo, é preciso, em sua visão, acompanhar as etapas anteriores do processo.

 

Tendo isso mente, Souza buscou entender o fluxo dos financiamentos externos, verificando que apesar de financiarem projetos em diversas áreas, as organizações financeiras internacionais nem sempre consideram o ponto de vista e os impactos sociais das populações envolvidas nos projetos financiados. Em seguida, o Defensor detalhou o caso da Vila Nova Tatetuba, uma favela consolidada em uma área privada de São José dos Campos que, por ser contemplada por um programa de habitação financiado pelo BID, acabou sendo suprimida e seus moradores, removidos compulsoriamente para outro lugar a 14 quilômetros de onde moravam. Na época, não havia qualquer argumento jurídico para retirar as pessoas de lá, o que levou as autoridades locais a recorrer ao argumento do risco de desmoronamento das casas.

 

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Souza tomou conhecimento do caso em 2007, logo após a Defensoria ter sido instituída em São Paulo. A retirada das famílias, contudo, já havia ocorrido em 2004, fundamentada no laudo emitido por um engenheiro atestando o risco de desmoronamento de 299 casas – posteriormente, verificou-se que apenas uma de fato corria o risco de tombar. Outras três comunidades foram transferidas para o mesmo local para onde foram as 299 famílias, o que gerou guerra de gangues e mortes de dezenas de jovens. “Essa denuncia foi feita pelos movimentos sociais, a Defensoria endossou e encaminhamos ao Banco Mundial. Uma representante do banco visitou a favela e pela primeira vez eu vi banqueiro chorar. E aí o banco começou a pressionar o município a resolver o problema”, relatou.

 

Durante a palestra, Jairo Salvador de Souza detalhou todas as etapas do seu trabalho até chegar ao BID. Também traçou o contexto histórico, econômico, político e social de São José dos Campos. A população do entorno da favela à época, por exemplo, foi a favor da remoção das pessoas e houve valorização destes terrenos. As áreas adjacentes aos locais de reassentamento também se valorizaram e vários loteamentos surgiram em torno do local. Souza mostrou também os principais atores relacionados ao tema e seus interesses.

 

Entre as estratégias adotadas pela Defensoria para combater esse tipo de política pública, Souza destacou a promoção da educação em direitos da população, o combate ao mito do crescimento desordenado e o incentivo à discussão pública sobre o modelo de desenvolvimento adotado. No âmbito judicial, algumas das medidas foram a defesa dos moradores, produção de laudos diverges, proposição de 30 ações judiciais e prosseguimento na ação do usucapião coletivo. No âmbito extrajudicial, foi feita a denúncia ao órgão financiador, ao Ministério da Justiça, à Comissão de Direitos Humanos do Senado, a criação de associações de bairro, o programa de educação em direitos com uma universidade local e o fortalecimento de laços de solidariedade de outras lideranças com a causa dos moradores.

 

Ao final de sua apresentação, Jairo de Souza apresentou os resultados da iniciativa junto à comunidade: condenação do município a indenizar os moradores por danos materiais e morais; acordo firmado para atendimento habitacional dos moradores removidos em área próxima ao local, com padrão construtivo concertado com os moradores; rompimento do eixo judiciariocêntrico e reconhecimento da existência de outros direitos (pluralismo jurídico), entre outros.

 

Por fim, o Defensor anunciou que o BID se disponibilizou a participar de um seminário junto com a Edepe a fim de fornecer aos Defensores mais detalhes sobre o trabalho. Adriana Burger, diretora da ENADEP, que estava à mesa com o Defensor, encerrou o evento. “Nós aprendemos muito com você, Jairo, e ao longo de todo o dia de hoje. Gostaria de ressaltar a importância de trocar experiências com outros colegas, como tem ocorrido nestes seminários”, disse.

 

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