Escola privada não pode cobrar mais de alunos deficientes

Por 9 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal rejeitou – no mérito – a ação de inconstitucionalidade (ADI 5.357) proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen) contra dispositivos do novo Estatuto da Pessoa Deficiente que estariam em choque com as normas da Carta de 1988 referentes ao direito de propriedade, da sua função social (artigos 5º e 170) e ao princípio da livre iniciativa. [...]

Por 9 votos a 1, o Supremo Tribunal Federal rejeitou – no mérito – a ação de inconstitucionalidade (ADI 5.357) proposta pela Confederação Nacional dos Estabelecimentos de Ensino (Confenen) contra dispositivos do novo Estatuto da Pessoa Deficiente que estariam em choque com as normas da Carta de 1988 referentes ao direito de propriedade, da sua função social (artigos 5º e 170) e ao princípio da livre iniciativa.

Em suma, na sessão desta quinta-feira (9/6), a maioria dos ministros do Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que as escolas privadas não podem cobrar a mais nas mensalidades para receber alunos com deficiência.

Com exceção do ministro Marco Aurélio, todos os ministros acompanharam o voto do relator, ministro Edson Fachin, que, que, primeiramente, submeteu a seus pares o referendo da sua decisão liminar que tinha já negado o pleito da entidade das escolas particulares. O ministro Celso de Mello não compareceu à sessão.

Para a Confenen, os dispositivos atacados do novo estatuto (Lei 13.146/2015) estão na contramão dos seguintes artigos da Constituição: 205 (“educação é dever do Estado e da família”); 206 (“liberdade de aprender e de ensinar; pluralismo de ideias e de concepções pedagógicas; coexistência de instituições públicas e privadas; 208 (“dever do Estado o atendimento a portador de necessidade especial”); 209 (“liberdade de ensino à livre iniciativa”).

Os votos

O relator da ação, Edson Fachin, defendeu a tese de que as instituições privadas de ensino exercem atividade econômica, mas devem se adaptar para acolher as pessoas com deficiência, prestando serviços educacionais que não enfoquem a questão da deficiência limitada à perspectiva médica, mas também ambiental.

Ele disse, inicialmente, que a busca na “tessitura constitucional” para a resposta jurídica nesta ação devia partir da noção de que a atuação do Estado em face de deficientes é uma “ação positiva em dupla via”, não dizendo respeito, apenas, à inclusão das pessoas deficientes, mas também ao direito de todos os demais cidadão “a uma arena plural na democracia”. Destacou que a Constituição prevê, em diversos dispositivos, a proteção da pessoa com deficiência, e que “pluralidade e igualdade são duas faces da mesma moeda”.

Para Fachin, o ensino privado não deve privar os insuficientes da convivência com os demais alunos, nem os estabelecimentos privados deveriam ter sido surpreendidos com a lei de 2015, que reflete convenção internacional incorporada como regra à Constituição há mais de 20 anos. Ele ressaltou ainda que as instituições privadas de ensino exercem atividade legítima, com base no princípio da livre iniciativa, mas que devem prestar serviços aos deficientes, com base no dispositivo constitucional de que a educação é “direito de todos e dever do Estado e da família”, devendo ser “promovida e incentivada com a colaboração da sociedade”.

Ainda conforme o relator, “à escola não é dado escolher, separar; mas seu dever é incluir e conviver”. Além disso, o ensino particular não deve “privar os insuficientes da convivência com os demais alunos”.

“Corre-se o risco de se conceder às instituições particulares de ensino odioso privilégio do qual não se podem furtar os demais agentes econômicos. Privilégio odioso porque oficializa a discriminação”, afirmou Fachin.

No único voto divergente, o ministro Marco Aurélio – sempre o nono a votar – fez um pronunciamento no sentido de que a ação da Confenen deveria ser acolhida em parte, tendo em vista, em síntese, os seguintes argumentos:
“Espero ir para o céu, e não para o inferno. A preocupação é geral para os portadores de necessidades especiais. Mas as esferas são diversas, em termos de direito, moral e religião. A Lei 13.146/15, que está sendo apreciada pela derradeira trincheira da cidadania, previu providências de repercussão maior”.

Ele destacou a existência, na lei, de “inúmeras normas” a serem adotadas urgentemente pelo setor privado, a fim de aprimorar os sistemas educacionais existentes, como, por exemplo: ter projeto específico pedagógico, adotar medidas individualizadas e coletivas, em ambientes que maximizem a situação dos deficientes; planejamento de estudo de casos; participação dos estudantes nas diversas instâncias de atuação na atividade escolar; acesso à educação superior e profissional.

Para Marco Aurélio, “são providências múltiplas a serem adotadas pelo setor privado, que fica impossibilitado de proceder a qualquer cobrança adicional”. E indagou: “Será que essa lei se coaduna com os ares constitucionais libertários que passamos a viver depois de tantos anos?!”. E acrescentou: “Esta é uma lei como aquelas que talvez sejam editadas para dar esperanças vãs à sociedade, editadas no campo do faz-de-conta. São aquelas ‘leis pra inglês ver’. Não pode o Estado cumprimentar com o chapéu alheio. Em se tratando de mercado, a intervenção estatal deve ser minimalista. A educação é dever de todos. Mas é dever precípuo do Estado”.

FONTE: JOTA

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