Deliberação CSDP nº 291, de 14 de fevereiro de 2014.

Deliberação CSDP nº 291, de 14 de fevereiro de 2014.

 

Organiza a política institucional de atendimento às mulheres presas visando assegurar gestação segura e o exercício da maternidade durante o período da custódia penal, bem como a garantia, com prioridade absoluta, dos direitos das crianças e dos adolescentes.

O CONSELHO SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO,

CONSIDERANDO as atribuições do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, conferidas pelo artigo 31, inciso III, da Lei Complementar 988/06;

CONSIDERANDO que a Constituição Federal garante a todas as pessoas o direito de acesso à Justiça e à ampla defesa e assegura às pessoas presas o respeito à integridade física e moral;

CONSIDERANDO que a Lei Complementar nº 80/94, reconheceu a Defensoria Pública como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, a quem incumbe a promoção dos direitos humanos e a atuação nos estabelecimentos policiais e penitenciários, visando a assegurar às pessoas, sob quaisquer circunstâncias, o exercício pleno de seus direitos e garantias fundamentais;

CONSIDERANDO a dinâmica social patriarcal que opera uma divisão sexual do trabalho traduzida no aprisionamento de mulheres e homens em papeis sociais pré-definidos, destinando, assim, às mulheres, de forma quase exclusiva, a função social do cuidado com os filhos, no interior das famílias;

CONSIDERANDO o aumento do número de mulheres reclusas, bem como o perfil dessas mulheres, majoritariamente pobres, jovens e, em regra, responsáveis principais pelo sustento e cuidado dos filhos;

CONSIDERANDO que o Estado tem o dever de assegurar e prestar a assistência à saúde durante a gestação, incluído o direito ao parto em condições adequadas e a promoção da manutenção dos vínculos familiares, não excluídas as pessoas presas;

CONSIDERANDO que a Constituição Federal, no artigo 227, caput, dispõe como dever da família, do Estado e da sociedade assegurar à criança, ao adolescente e jovem com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-la a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão;

CONSIDERANDO o artigo 5º, L, da Constituição Federal;

CONSIDERANDO a Convenção sobre os Direitos da Criança em seus artigos 9° e 21 e o Estatuto da Criança e do Adolescente;

CONSIDERANDO as Regras de Bangkok, Regras Mínimas da ONU para o Tratamento de Mulheres Presas, sobretudo as Regras 2, 3, 26 a 28;

CONSIDERANDO a Lei de Execução Penal, em seu artigo 117, inciso III;

CONSIDERANDO o artigo 318, inciso IV do Código de Processo Penal, com a nova redação que lhe foi conferida pela Lei 12.403/2011;

CONSIDERANDO a Carta de São Paulo, documento resultante dos debates ocorridos no Seminário “Mães do Cárcere: Construindo Caminhos para a Garantia da Convivência Familiar de Mulheres e Crianças”, organizado pela Defensoria Pública do Estado de São Paulo, pela Pastoral Carcerária e pelo Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, nos dias 18 e 19 de agosto de 2011, contando com a participação de magistrados, Defensores Públicos, assistentes sociais, psicólogos, representantes da Sociedade Civil e Servidores dos Poderes Executivo e Judiciário;

DELIBERA:

Artigo 1º. A política institucional de que trata a presente Deliberação compreende o atendimento jurídico integral, em todo o Estado de São Paulo, às mulheres presas que estejam grávidas ou em período de amamentação, bem como àquelas que tenham filhos com menos de 18 anos em situação de vulnerabilidade decorrente da custódia penal de sua mãe ou cujo convívio esteja obstruído.

Artigo 2º – Os preceitos estabelecidos nesta Deliberação e as atividades dela decorrentes serão acompanhados pela Primeira Subdefensoria, Núcleos Especializados da Infância e Juventude, de Situação Carcerária e de Promoção e Defesa dos Diretos da Mulher, e apoiados pelos Agentes e Assistentes Técnicos de Defensoria classificados nos Núcleos, nos Centros de Atendimento Multidisciplinares e na Assessoria Técnica Psicossocial.

Artigo 2º. Os preceitos estabelecidos nesta Deliberação e as atividades dela decorrentes serão acompanhados pela Primeira Subdefensoria, Núcleos Especializados da Infância e Juventude, de Situação Carcerária e de Promoção e Defesa dos Diretos da Mulher, e apoiados pelos Agentes e Assistentes Técnicos de Defensoria classificados nos Núcleos, nos Centros de Atendimento Multidisciplinares e vinculados às Assessorias Cível e Criminal e Infracional da Defensoria Pública-Geral. (Redação dada pela Deliberação CSDP nº 336, de 24 de fevereiro de 2017)

Parágrafo único – A assessoria que compõe a política de atendimento de que trata a presente deliberação será realizada por um grupo permanente, denominado CONVIVE.

Artigo 3º. Caberá à Primeira Subdefensoria-Geral a coordenação administrativa do CONVIVE, devendo, nos termos dessa Deliberação:

I – Realizar o contato com órgãos externos a fim de viabilizar a política de atendimento;

II – Efetivar a comunicação aos Defensores a fim de dar ampla publicidade interna às obrigações constantes desta Deliberação;

III – Fornecer ao CONVIVE e aos Núcleos apoio administrativo e de infraestrutura para a efetivação da política de atendimento.

Artigo 4º. Caberá ao Núcleo Especializado de Infância e Juventude, nos termos dessa Deliberação:

I – Fornecer apoio jurídico aos Defensores naturais da área da infância e juventude;

II – Atuar nos casos de demandas na área da infância e juventude identificados pelo CONVIVE onde não houver Defensoria Pública instalada;

III – Coordenar diretamente as atividades do CONVIVE, fornecendo apoio técnico-jurídico aos seus integrantes;

IV – Articular as políticas sociais básicas com intuito de fortalecer a parceria com os serviços de acolhimento institucional estimulando ações de reintegração familiar.

Artigo 5º. Caberá ao Núcleo Especializado de Situação Carcerária, nos termos dessa Deliberação:

I – Fornecer apoio jurídico aos Defensores naturais da área criminal;

II – Atuar nos casos de demandas criminais identificados pelo CONVIVE onde não houver Defensoria Pública instalada;

III – Coordenar diretamente as atividades do CONVIVE, fornecendo apoio técnico-jurídico aos seus integrantes.

Artigo 6º. Caberá ao Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher:

I – Elaborar projeto contínuo de educação em direitos, com o apoio dos demais núcleos especializados, voltado para as questões afetas à política de atendimento estabelecida na presente Deliberação e articular a sua promoção nas unidades prisionais do Estado;

II – Organizar publicação anual a partir dos dados sistematizados nos relatórios semestrais elaborados pelo CONVIVE, em parceria com a EDEPE;

III – Atuar em questões coletivas que envolvam suspeita ou violação dos direitos humanos das mulheres encarceradas, nos termos do regimento interno do respectivo núcleo, sem exclusão de atuação do Núcleo Especializado de Situação Carcerária e do Defensor Natural;

IV – Atuar nos casos de demandas na área de família identificados pelo CONVIVE onde não houver Defensoria Pública instalada.

Artigo 7º. Caberá à Assessoria Técnica Psicossocial e aos Servidores de Defensoria classificados nos Núcleos Especializados, nos termos dessa Deliberação:

I – Apoiar os Defensores Públicos e os demais Agentes de Defensoria na gestão e execução da política de atendimento;

II – Sistematizar os dados e elaborar relatórios e diagnósticos técnicos e estatísticos, bem como divulgar as informações referentes aos atendimentos e encaminhamentos realizados.

  • 1º – Caberá aos Centros de Atendimento Multidisciplinar colaborar com as atividades envolvidas na política de atendimento estabelecida na presente Deliberação, em conformidade com o disposto na Deliberação CSDP nº 187/2010.

  • 2º – Durante a fase de instalação e início das atividades estabelecidas na presente Deliberação, poderá ser designado, por ato da Defensoria Pública-Geral, Defensor Público para exercer a coordenação geral da atividade.

Artigo 8º. O CONVIVE é uma assessoria de gestão informacional, à qual caberá receber os casos, registrar e encaminhar aos órgãos responsáveis.

  • 1º – O CONVIVE será composto ao menos por dois Servidores da Defensoria, um estagiário administrativo cursando nível superior e dois estagiários de direito.

  • 2º – O CONVIVE receberá a devolutiva acerca dos encaminhamentos tomados pelos órgãos responsáveis.

  • 3º – O CONVIVE contará com suporte dos Agentes de Defensoria Sociólogos classificados nos Núcleos Especializados para a sistematização e análise dos dados, bem como elaboração de relatórios semestrais.

Artigo 9º. O CONVIVE receberá as demandas de atendimento, dentre outras formas, por meio de:

I – Formulários da Secretaria de Administração Penitenciária, preenchidos quando da inclusão das mulheres nas unidades prisionais;

II – Defensores Públicos, que tomem conhecimento de casos contemplados por essa Deliberação no exercício de suas funções, especialmente durante visitas a estabelecimentos prisionais;

III – Organizações Não Governamentais e Entidades Sociais;

IV – Correspondência remetida à Defensoria Pública diretamente pelos Usuários do serviço ou por outros órgãos;

V – Centros de Atendimento Multidisciplinar;

VI – Familiares e amigos das mulheres presas.

Artigo 10. O CONVIVE encaminhará as demandas:

I – Ao órgão de atuação natural atuante na área da infância e juventude e na área de família para intervenção nos casos em que o encarceramento da mãe represente risco ao direito ao convívio familiar e comunitário, visando à manutenção ou ao restabelecimento do vínculo com a criança ou adolescente;

II – Ao Núcleo Especializado da Infância e Juventude quando, nas hipóteses do inciso anterior, o CONVIVE identificar que inexiste órgão de atuação natural vinculado ao processo;

III – Ao órgão de atuação natural atuante da área criminal, nos casos em que a maternidade ou gestação permitam a formulação de pleito judicial específico, visando ao desencarceramento, como prisão domiciliar, indulto ou revogação de prisão cautelar, sem prejuízo de outros casos identificados pelo CONVIVE que demandem a atuação institucional;

IV – Ao Núcleo Especializado de Situação Carcerária quando, nas hipóteses do inciso anterior, o CONVIVE identificar que não há órgão natural vinculado ao processo judicial ou administrativo;

V – Ao Núcleo Especializado de Promoção e Defesa dos Direitos da Mulher quando identificar hipóteses previstas no artigo 6º, inciso III, da presente Deliberação.

Parágrafo único – Os órgãos que receberem os encaminhamentos deverão informar ao CONVIVE, com brevidade, acerca dos encaminhamentos tomados, de acordo com os padrões e categorias formulados pelo CONVIVE para fins de registro e cômputo dos dados.

Artigo 11. Os Defensores Públicos e Agentes de Defensoria atuantes nas áreas criminal, execução criminal, infância e juventude e família, no exercício de suas funções ordinárias, informarão o CONVIVE quando verificarem as seguintes situações, sempre que estiverem relacionadas a mulheres presas:

I – Quando a mãe presa declarar que desconhece o paradeiro de seus filhos;

II – Quando os filhos estiverem acolhidos;

III – Quando houver pessoa que tem a guarda de fato dos filhos, havendo necessidade de regularização;

IV – Quando os filhos estiverem cumprindo medida socioeducativa ou submetidos à medida protetiva, nos termos do Estatuto da Criança e do Adolescente;

V – Quando se identificar a existência de processo judicial de aplicação de medida que implique no acolhimento institucional da criança, destituição de poder familiar, adoção em curso ou quando se identificar que a criança já foi adotada sem o consentimento desimpedido da mãe;

VI – Quando se identificar a existência de óbices à promoção de visitas da criança ao estabelecimento prisional em que a mãe se encontra recolhida;

VII – Quando a mulher declarar estar grávida ou ser lactante;

VIII – Quando se identificar a possibilidade de qualquer pleito judicial específico acerca da maternidade perante o juízo criminal.

Artigo 12. O atendimento à mãe presa em caráter provisório pelos Defensores Públicos criminais dar-se-á com observância ao disposto na Deliberação CSDP n. 246/2012.

Artigo 13. A realização do pedido no caso da presa lactante não encerra o atendimento, devendo esta ser contatada pelo Defensor Público para esclarecer se indica algum familiar ou pessoa de sua confiança para cuidar da criança, na hipótese de ser negado provimento ao pedido de prisão albergue domiciliar ou de extensão do período de amamentação.

Artigo 14 – Nos casos em que o CONVIVE, identificando situação de risco para o vínculo familiar entre a mulher presa e o filho, verificar a necessidade de levantamento de informações mais detalhadas, diligenciará junto à unidade prisional, solicitando a aplicação do questionário expandido, cujo modelo será disponibilizado pelo próprio CONVIVE.

  • 1º Não sendo possível o procedimento previsto nocaputou sendo as informações consideradas insuficientes, o CONVIVE encaminhará o caso ao Defensor com atribuição na área da Infância ou da Família, que poderá, dentre outras providências, acionar:

I – O CAM da Unidade pertinente, a fim de coletar as informações necessárias;

II – O defensor com atribuição na esfera criminal, de conhecimento ou de execução, que regularmente visita o estabelecimento em que a Usuária está presa, para que aplique o questionário expandido e/ou obtenha as informações necessárias, remetendo-as ao Defensor solicitante, caso haja previsão de visita ao local em data próxima, dentro de seu cronograma regular de visitas.

  • 2º – Caso não haja previsão de visita ao local em data próxima, deve o Defensor responsável, observada a urgência do caso, avaliar a necessidade de readequação do cronograma de visitação.

Artigo 15. O Núcleo Especializado de Infância e Juventude deverá, com o apoio da assessoria de convênios da Defensoria Pública, contatar o advogado dativo nomeado para o processo, solicitando acompanhamento da demanda para instrução de processo administrativo no âmbito do núcleo, visando à produção de relatório periódico.

Parágrafo único – Caso o Núcleo Especializado identifique a insuficiência ou irregularidade na atuação promovida por advogado ou entidade conveniada deverá providenciar o encaminhamento à COMISTA e ou Assessoria de Convênios da Defensoria Pública, bem como adotar as medidas emergenciais cabíveis à defesa da Usuária.

Artigo 16. A informação à pessoa presa quanto às providências adotadas é indispensável e integra o atendimento jurídico, devendo ser realizada pelo próprio Defensor Público atuante no caso, via postal ou pessoalmente quando o procedimento exigir mais cautela, como nos casos que envolvam rompimento do vínculo familiar.

  • 1º – Nos casos em que houver necessidade de contato pessoal com a mulher presa, o Defensor Público do caso poderá solicitar que o atendimento pessoal seja realizada pelo Defensor Público atuante na esfera criminal que regularmente visita o estabelecimento, nos moldes do que prevê o artigo 14, §1º, inciso II e §2º.

  • 2º – A solicitação de atendimento de que trata o §1º deverá ser sempre acompanhada de relatório minucioso do caso, com indicação de todas as providências adotadas pela Defensoria.

  • 3º – Sempre que possível, a comunicação pessoal à mulher presa deverá ser acompanhada por um Agente do CAM.

Artigo 17. Semestralmente, a contar da data de entrada em vigor desta Deliberação, o

CONVIVE irá sistematizar, analisar e divulgar, com o apoio da Assessoria de Comunicação Social e Imprensa, EDEPE e demais órgãos envolvidos, relatório das atividades desenvolvidas no período e resultados obtidos.

Artigo 18. Anualmente será realizada audiência pública a ser organizada pela Primeira Subdefensoria Pública-Geral e os Núcleos Especializados da Infância e Juventude – NEIJ; Situação Carcerária – NESC e Promoção dos Direitos da Mulher – NUDEM.

Parágrafo único – A primeira audiência pública de que trata o presente artigo será realizada após 6 meses da entrada em vigor da presente deliberação.

Artigo 19. Os Defensores Públicos, Agentes de Defensoria e demais Servidores envolvidos na atividade de que trata a presente Deliberação deverão, com o apoio da EDEPE, frequentar cursos de capacitação e atualização nas áreas contempladas.

Artigo 20. As disposições constantes dessa Deliberação aplicam-se também aos pais presos, bem como aos casos em que a paternidade tenha implicações na situação processual do Usuário.

Artigo 21. As disposições constantes dessa Deliberação também se aplicam à mãe adolescente ou jovem internada em unidade da Fundação Casa, no que couber, adaptando-se o fluxo dos trabalhos no que concerne à atribuição dos órgãos envolvidos.

Artigo 22. As disposições dessa Deliberação também se aplicam às hipóteses de filho com 18 anos ou mais que, por deficiência física ou intelectual ou qualquer circunstância de maior vulnerabilidade, demandem o atendimento de que trata a presente normativa.

Artigo 23. O “CONVIVE” padronizará e disponibilizará os formulários, questionários e congêneres indicados nessa Deliberação.

Artigo 24. A presente Deliberação entra em vigor na data de sua publicação.

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