Deliberação CSDP nº 246, de 23 de março de 2012 (REVOGADA)

DELIBERAÇÃO CSDP Nº 246, DE 23 DE MARÇO DE 2012

 (REVOGADA pela Deliberação CSDP nº 297/14)

 

Organiza a política institucional de atendimento às pessoas presas provisoriamente e de monitoramento das condições de detenção dos atendidos pela Defensoria Pública do Estado

 

CONSELHO SUPERIOR DA DEFENSORIA PÚBLICA DO ESTADO,

 

CONSIDERANDO as atribuições do Conselho Superior da Defensoria Pública do Estado de São Paulo, conferidas pelo artigo 31, inciso III, da Lei Complementar 988/06;

 

CONSIDERANDO que a Constituição Federal garante a todas as pessoas o direito de acesso à Justiça e à ampla defesa e assegura às pessoas presas o respeito à integridade física e moral;

 

CONSIDERANDO que a Lei Complementar nº 80/94, reconheceu a Defensoria Pública como instituição permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, a quem incumbe a promoção dos direitos humanos e a atuação nos estabelecimentos policiais e penitenciários, visando a assegurar às pessoas, sob quaisquer circunstâncias, o exercício pleno de seus direitos e garantias fundamentais;

 

CONSIDERANDO que a Convenção contra a Tortura e Outros Tratamentos ou Penas Cruéis, Desumanos ou Degradantes (ONU, 1984) estabelece a obrigação de cada Estado Parte (consequentemente, de suas instituições e órgãos) de tomar “medidas legislativas, administrativas, judiciais ou de outra natureza com o intuito de impedir atos de tortura no território sob a sua jurisdição”, assim como de manter “sob exame sistemático as regras, instruções, métodos e práticas de interrogatório, bem como disposições sobre detenção e tratamento das pessoas submetidas a qualquer forma de detenção ou prisão, em qualquer território sob a sua jurisdição, com o escopo de evitar qualquer caso de tortura”;

 

CONSIDERANDO que a Lei de Execução Penal incumbiu a Defensoria Pública de “visitar os estabelecimentos penais, tomando providências para o adequado funcionamento, e requerer, quando for o caso, a apuração de responsabilidade” (artigo 81-B, inciso V); e

 

CONSIDERANDO que, para o efetivo desempenho do múnus público referido no item anterior, a Lei Complementar 80/94, na redação dada pela Lei Complementar nº 132/09, e a Lei Complementar 988/06 estabelecem a prerrogativa dos Defensores Públicos de “comunicar-se, pessoal e reservadamente, com seus assistidos, ainda quando estes se acharem presos ou detidos, mesmo incomunicáveis, tendo livre ingresso em estabelecimentos policiais, prisionais e de internação coletiva, independentemente de prévio agendamento” (artigo 128, inciso VI, e artigo 162, incisos X e XI);

 

DELIBERA:

 

Artigo 1º – A política institucional de que trata a presente Deliberação compreende o atendimento jurídico às pessoas presas provisoriamente e a verificação das condições materiais de privação de liberdade das pessoas atendidas pela Defensoria Pública do Estado, tendo em vista a garantia dos direitos humanos de acesso à Justiça, à ampla defesa e à integridade física e moral.

 

I – DO ATENDIMENTO JURÍDICO AS PESSOAS PRESAS PROVISORIAMENTE

 

Artigo 2º – O atendimento jurídico às pessoas presas provisoriamente, nas cidades onde a Defensoria Pública atua na área criminal, será feito pelos Defensores Públicos oficiantes em Varas Criminais, Singulares ou do Júri, e Juizados Especializados em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, e deverá ser realizado antes da apresentação da resposta à acusação ou da defesa preliminar, objetivando o conhecimento dos fatos e de eventuais testemunhas e o esclarecimento sobre a atuação da Defensoria Pública do Estado, sobre curso de um processo criminal e sobre os direitos do réu.

 

§ 1º – O atendimento descrito no caput deverá ser realizado também pelos advogados que prestem assistência judiciária a pessoas carentes mediante convênio com a Defensoria Pública do Estado.

 

§ 2º – O atendimento não deverá ocorrer quando a pessoa presa informar ter constituído advogado particular para a sua defesa.

 

§ 3º – No primeiro atendimento ao(à) preso(a) provisório(a), deverá ser perguntado a ele(a) sobre a existência de filhos sob sua exclusiva responsabilidade no momento da prisão, encaminhando as informações colhidas aos Defensores Públicos atuantes na Vara da Infância e Juventude, nos termos de regulamentação específica.

 

Artigo 3º – O atendimento jurídico às pessoas presas provisoriamente poderá ser feito no Fórum da Comarca ou no estabelecimento penal em que estiverem detidas.

 

Parágrafo único – Em ambos os casos, o atendimento deverá ser feito em local adequado, privado e reservado.

 

Artigo 4º – O atendimento jurídico às pessoas presas provisoriamente feito no Fórum da Comarca será precedido por pedido de requisição, ao Juiz ou autoridade administrativa competente, da apresentação do preso.

 

§ 1º – A Defensoria Pública Geral do Estado empreenderá esforços junto ao Tribunal de Justiça e ao Governo do Estado para que se garanta o transporte das pessoas presas requisitas pelos Defensores Públicos, bem como para a instalação de espaços adequados para o atendimento.

 

§ 2º – No caso do indeferimento da requisição, a pessoa presa deve ser informada pessoalmente de sua situação processual.

 

Artigo 5º – O atendimento jurídico às pessoas presas provisoriamente feito nos estabelecimentos penais em que estiverem detidas será realizado sempre que: as requisições não sejam atendidas em tempo hábil para a apresentação da resposta à acusação ou da defesa preliminar; em casos urgentes ou especiais, a critério do Defensor Público natural; ou se essa forma de atendimento for a melhor naquela cidade ou estabelecimento.

 

§ 1º – Dada a impossibilidade material de os Defensores Públicos naturais visitarem todos os estabelecimentos penais em que podem estar detidas pessoas por eles atendidas, o atendimento jurídico nos estabelecimentos penais será organizado na forma prevista no Artigo 6º desta Deliberação.

 

§ 2º – Configurada a necessidade ou a melhor adequação do atendimento jurídico no estabelecimento penal, o Defensor Público natural comunicará os Defensores Públicos responsáveis pelo atendimento, fornecendo-lhes as informações que avaliar necessárias para o atendimento.

 

II – DO ATENDIMENTO JURÍDICO NO ESTABELECIMENTO PRISIONAL

 

Artigo 6º – Os atendimentos jurídicos nos estabelecimentos prisionais serão realizados por Defensores Públicos atuantes em Varas Criminais, Singulares ou do Júri, e Juizados Especializados em Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher e serão organizados em cada Regional ou Unidade da Defensoria Pública do Estado, sob a coordenação das 2ª e 3ª Subdefensorias Públicas-Gerais.

 

§ 1º – Serão considerados nessa organização o número de Defensores Públicos de cada Regional ou Unidade, suas atribuições ordinárias e extraordinárias, o número de estabelecimentos penais que abriguem presos provisórios na região e a distância entre eles.

 

§ 2º – Cada Defensor Público deverá realizar pelo menos duas visitas por mês, sempre que possível, ao mesmo estabelecimento penal.

 

§ 3º – O atendimento será realizado com todas as pessoas presas recém ingressas no estabelecimento prisional, ainda que submetidas ao regime de observação, mesmo que transferidas de outro estabelecimento.

 

§ 4º – Em caso de atendimento a pessoa presa cujo processo seja de responsabilidade de advogado conveniado, as medidas voltadas à revogação da custódia cautelar, quando cabíveis, deverão ser adotadas pelo próprio Defensor Público designado.

 

Artigo 7º – Quando forem detectados casos urgentes ou especiais que necessitem de atendimento jurídico, independentemente de prévia solicitação do Defensor Público natural, os Defensores Públicos que realizam a visita prestarão esses atendimentos e encaminharão as informações coletadas ao Defensor Público natural.

 

Artigo 8º – Esta Deliberação e suas disposições transitórias entram em vigor na data da sua publicação.

 

DAS DISPOSIÇÕES TRANSITÓRIAS

 

Artigo 1º – A implantação da política institucional ora estabelecida será feita de forma gradual, iniciando-se pela execução do projeto piloto nas unidades previstas no Anexo I, podendo este ser ampliado para outras Unidades, por meio de Ato do Defensor Público-Geral do Estado, conforme as peculiaridades locais e/ou a partir da análise dos resultados apurados nos locais em que a medida foi iniciada.

 

§ 1º – O prazo de duração deste projeto piloto será de 6 meses.

 

§ 2º – Antes de se iniciar a implantação deste projeto, far-se-á diagnóstico preliminar para averiguar a atual situação processual das pessoas presas provisoriamente nas unidades prisionais a serem atendidas, utilizando-se como base questionário a ser desenvolvido pelo Núcleo Especializado de Situação Carcerária.

 

§ 3º – A implementação deste projeto será monitorada e avaliada por meio de relatórios parciais a serem apresentados trimestralmente pelos Defensores Públicos que participarem das atividades, utilizando-se como base modelo a ser desenvolvido pelo Núcleo Especializado de Situação Carcerária, e por meio de relatório final a ser apresentado pela Defensoria Pública-Geral dois meses após o término do projeto.

 

§ 4º – Os relatórios referidos no § 3º serão analisados por comissão participativa, formada pela Subdefensorias Públicas-Gerais, pelos Núcleos Especializados de Situação Carcerária e de Cidadania e Direitos Humanos, pela Ouvidoria-Geral, pela Escola da Defensoria, por representante do grupo de Defensores Públicos atuante nos estabelecimentos prisionais e por representante da sociedade civil.

 

§ 5º – Após a análise dos relatórios, a comissão participativa de avaliação deverá propor projeto de implantação gradual e integral da política institucional de atendimento às pessoas presas provisoriamente em todo o estado de São Paulo.

 

Artigo 2º – O atendimento jurídico às pessoas presas provisoriamente nos estabelecimentos previstos no Anexo I da presente Deliberação, não atendidas previamente pelos Defensores Públicos naturais, seja pela inviabilidade da requisição, seja pela impossibilidade manifesta de deslocamento do Defensor Público, será realizado por Defensores Públicos classificados nas unidades mencionadas no Anexo II.

 

Parágrafo único – As informações essenciais ao bom atendimento jurídico deverão ser coletadas por meio de ficha padronizada a ser elaborada pelo Núcleo Especializado de Situação Carcerária em conjunto com os Defensores atuantes nas unidades prisionais indicadas no caput.

 

Artigo 3º – O atendimento jurídico de que trata esta fase inicial de implantação da política institucional será realizado por Defensores Públicos especialmente designados para tal mister, sem prejuízo de suas atribuições ordinárias e em quantidade e frequência de visitas a serem definidas por Ato do Defensor Público-Geral do Estado.

 

§ 1º – Os Defensores Públicos designados para a atividade deverão, após a entrevista com a pessoa presa, contatar o Defensor Público natural, encaminhando-lhe os dados para instruir a defesa técnica, as solicitações apresentadas pela pessoa atendida, bem como os elementos voltados à revogação da custódia cautelar.

 

§ 2º – No curso do atendimento, verificada violação de direitos relativa às condições de aprisionamento, deverá o Defensor Público comunicar o fato ao Núcleo Especializado de Situação Carcerária, sem prejuízo de adoção das medidas urgentes.

 

Artigo 4º – Será constituído grupo de trabalho no âmbito da Defensoria Pública Geral do Estado para o fim de, no prazo máximo de noventa dias, desenvolver a documentação e a metodologia de atuação para a realização das visitas de verificação das condições materiais de privação de liberdade de assistidos da Defensoria Pública.

 

§ 1º – O grupo de trabalho será composto por ao menos sete integrantes, sendo um representante indicado pelos seguintes órgãos: Núcleo Especializado de Situação Carcerária; Núcleo Especializado de Cidadania e Direitos Humanos, Escola da Defensoria Pública, Ouvidoria-Geral; Regional Criminal da Capital; Unidade do Interior e Defensoria Pública-Geral.

 

§ 2º – No desempenho de seu trabalho o grupo deverá considerar a experiência acumulada pelos órgãos da Defensoria Pública e pelas organizações da sociedade civil relacionadas ao tema, bem como os aportes de organismos internacionais de prevenção e enfrentamento da tortura da Organização das Nações Unidas e da Organização dos Estados Americanos.

 

§ 3º – Findo o prazo estabelecido no caput o grupo deverá apresentar à Defensoria Pública-Geral relatório conclusivo contendo:

 

a) Proposta de organização da atividade, incluindo a forma de seleção e formação dos grupos de Defensores Públicos que realizarão as visitas de verificação, a periodicidade de tais visitas, os locais preferenciais de atuação e a forma pela qual serão colhidas, encaminhadas e, se o caso, divulgadas as informações colhidas no bojo do projeto;

b) Minutas dos atos administrativos necessários à implementação da atividade de verificação das condições de privação de liberdade dos assistidos da Defensoria Pública por Defensores Públicos;

c) Guia de orientação para os Defensores Públicos que venham a realizar a referida atividade;

d) Locais indicados para o desenvolvimento de um projeto piloto e sua respectiva duração.

 

§ 4º – O grupo deverá acompanhar as atividades de verificação das condições materiais de privação de liberdade de assistidos da Defensoria Pública que venham a ser desenvolvidas pelo projeto piloto, nos primeiros sessenta dias de atuação, após o que, se necessário, fará propostas de ajuste dos materiais e metodologias previamente estabelecidos, para o fim do estabelecimento de um projeto permanente pela Defensoria Pública do Estado.

 

§ 5º – As reuniões deverão ser organizadas pela Defensoria Pública-Geral, com periodicidade a ser definida pela própria Comissão.

 

 

ANEXO I – RELAÇÃO DOS ESTABELECIMENTOS

 

 

Unidade

Lotação[1]

Ingresso semanal – média

Perfil / Peculiaridades

Inclusão – R.O.[2]

CDP I de Pinheiros

1428

150

Presos primários acusados da prática de furto (Capital). Estabelecimento conta com a atuação voluntária de advogados do IDDD

10 dias

CDP II de Pinheiros

1345

40

Recebe presos de outroas Unidades (“seguro” e anti facções) e oriundos da Delegacia da Mulher e aeroportos

Nâo há

CDP III de Pinheiros

1192

40

Recebe presos da Região Central, Guarulhos, e das prisões efeutadas pela Polícia Federal

10 dias

CDP IV de Pinheiros

1614

25

Presos pelo DEIC e DENARC; Unidade de trânsito,

30 dias

CDP de Franco da Rocha

 864

100 

Recebe presas das cadeias públicas do Interior e litoral; inclusão automática das presas da Capital e Grande São Paulo 

10 dias 

CDP de Ribeirão Preto

8815

60

Apenas presos provisórios – 95% dos presos são de Ribeirão Preto

10 dias

 

 

 

ANEXO II – RELAÇÃO DAS UNIDADES DA DEFENSORIA PÚBLICA

 

 

Estabelecimentos

Prisionais

Unidades da Defensoria Pública

CDPs de Pinheiros

Varas Singulares, Júri, Jecrim/DIPO e Juizado Especializado em Violência Domestica e Familiar contra a Mulher, todas da Regional Criminal da Capital

CDP de Franco da Rocha

Guarulhos

CDP de Ribeirão Preto

Ribeirão Preto



[1] Fonte: Secretaria de Administração Penitenciária (www.sap.sp.gov.br). Dados de 27/11/11

[2] R.O.: Regime de Observação

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