Mais de quatro anos após perder o filho, assassinado no fim de novembro de 2011 em Curitiba (PR) e enterrado como indigente, uma moradora de Araraquara (a 273 km da Capital) teve finalmente garantido pela Justiça o direito à retificação da certidão de óbito do familiar, por meio da atuação da Defensoria Pública de SP.
Como estava sem documentos quando foi morto, o filho foi levado ao Instituto Médico Legal (IML) como indigente e foi sepultado nessa condição – ou seja, sem seu nome e informações como filiação e data de nascimento. Sem uma certidão de óbito que comprovasse seu parentesco, a mãe ficou impedida de fazer o traslado do corpo para que realizasse um enterro em Araraquara (SP). Devido a suas limitações financeiras, a mãe só pôde ir em 2012 à capital paranaense para reconhecer o corpo.
Ação judicial
A mãe posteriormente procurou a Defensoria Pública em busca da retificação do registro de óbito do filho e do direito a realizar um enterro digno para o filho. Em novembro de 2014, o Defensor Luiz Carlos Fávero Junior ingressou com ação pedindo a correção do documento. Ele apontou que o artigo 212 da Lei de Registros Públicos (Lei nº 6.015/1973) prevê a possibilidade de retificação do registro ou averbação em caso de omissão, imprecisão ou se não exprimir a verdade.
Fávero argumentou que o princípio constitucional da dignidade humana também se estende aos mortos e que os familiares têm direito a ver a documentação referente à morte regularizada, condição para que se possa falar em morte digna. Entretanto, a Justiça em primeiro grau em Araraquara se declarou incompetente para julgar o pedido, que deveria ser analisado por uma das Varas de Registros Públicos de Curitiba.
Recurso
Em janeiro de 2015, a Defensoria recorreu da decisão por meio de agravo de instrumento ao Tribunal de Justiça paulista (TJSP), apontando que a Lei de Registros Públicos, no artigo 109, § 5º, permite ajuizamento da ação de retificação de registro civil tanto na comarca onde foi lavrado o registro quanto na comarca de domicílio do autor do pedido.
Além disso, a Defensoria ressaltou a situação de carência financeira da mãe, demonstrada pelo fato de ela ter sido atendida pela Defensoria Pública e por sua falta de recursos para viajar a Curitiba. Fávero Junior afirmou que negar a possibilidade de ajuizar a ação em Araraquara seria uma violação do princípio do acesso à Justiça, garantido no artigo 5º, inciso XXXV da Constituição Federal.
Decisões favoráveis
O TJSP, em decisão monocrática do Desembargador Cesar Ciampolini, acolheu o pedido da Defensoria, determinando a manutenção do processo em Araraquara. O Magistrado considerou que a regularização do registro pode ajudar a abrandar a dor da mãe, atingida pela morte violenta do filho. Ciampolini também ressaltou a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça apresentada pela Defensoria, que pacificou o entendimento de que a ação para correção do registro civil pode ser proposta em comarca diversa daquela onde o assento foi lavrado.
Em 29/2/2016, após a produção de provas e parecer favorável do Ministério Público, a Juíza Ana Cláudia Habice Kock, da 4ª Vara Cível de Araraquara, acolheu o pedido e determinou a retificação do registro de óbito.
FONTE: DPESP