Sindicato denuncia condições precárias em cadeias

A família de um idoso de 76 anos tinha certeza de que ele não sobreviveria no sistema penitenciário porque precisa realizar mensalmente um procedimento chamado de sangria e, desde que foi preso, há quatro anos, só fez isso em 2016. [...]
A família de um idoso de 76 anos tinha certeza de que ele não sobreviveria no sistema penitenciário porque precisa realizar mensalmente um procedimento chamado de sangria e, desde que foi preso, há quatro anos, só fez isso em 2016.
Por pouco, ele não se juntou aos 422 detentos mortos em 2015 por causas consideradas naturais, segundo a SAP (Secretaria de Administração Penitenciária). Porém, para médicos, funcionários e defensores públicos ouvidos pela reportagem, mortes poderiam ter sido evitadas com melhores condições do cárcere.
Atualmente são 233,2 mil detentos em 164 unidades. Segundo dados obtidos com exclusividade pelo DIÁRIO por meio da Lei de Acesso à Informação, nos últimos dois anos 962 presos foram mortos em unidades prisionais do estado. Destes, 872 por causas naturais. A SAP mandou a lista com o diagnostico de cada preso de 2015. A pasta disse não ser possível computar o ano anterior.
As mortes mais frequentes, conforme o relatório são: sepse, pneumonia, infarto, insuficiência respiratória, tuberculose, meningite e anemia. O local com  mais óbitos foi a Penitenciária de Sorocaba, com 11 casos.
Apesar de a maior parte dos casos ter ocorrido em hospitais, os presos e funcionários relatam que os doentes só são levados aos centros médicos quando há poucas chances de cura.
“Tivemos de fazer um escândalo para uma detenta de 51 anos, que não conseguia respirar direito, ser levada ao hospital. Agora ela vive com um aparelho para auxiliar na respiração, precisa de ajuda até no banho porque não consegue fazer esforço”, disse uma ex-presa da Penitenciária do Butantã, na Zona Norte da capital.
O médico clínico geral Paulo Camiz explicou que qualquer doença, quando tratada desde o começo, tem maiores chances de cura. “Se pegar uma pessoa com difícil acesso ao médico ou se o sistema de saúde for deficitário, ela sairá prejudicada. Essas pessoas só chegam ao médico quando conseguem convencer o carcereiro de que precisam de atendimento.”
O diretor de saúde do Sindicato dos Funcionários do Sistema Prisional, Luiz da Silva Filho, denunciou não ter médico na maior parte das unidades. “Recentemente houve um surto de sarna e os presos estavam sem sabonete. Tivemos de dividir um para quatro detentos. O sistema não cuida nem dos funcionários nem dos presos.”
Segundo ele, é comum presos tomarem banho gelado. “É claro que vão ficar doente sem colchão, sem cobertor e tomando banho gelado”, disse.
Relatório mostra péssimo estado de unidades
Celas com vazamento de esgoto, infiltrações, sem chuveiro quente, privadas quebradas, falta de iluminação, ventilação inadequada, sem colchões, enfermarias em estado degradante e presos doentes misturados com demais. Assim estão cinco unidades prisionais visitadas pelo Núcleo Especializado de Situação Carcerária da Defensoria Pública do Estado.
As visitas aconteceram entre janeiro e maio de 2015 nos CDPs (Centro de Detenção Provisória), de Itapecerica da Serra, Suzano, Mogi das Cruzes, na Grande São Paulo, e Praia Grande e São Vicente , ambos no litoral.
Em todas as unidades havia problemas de infiltrações e, em São Vicente, a própria enfermaria estava com vazamento de esgoto. Os locais também não contavam com colchões para todos os detentos, sendo que alguns dividiam ou improvisavam redes com lençol.
Segundo o Defensor Público Bruno Shimizu, a situação ainda é a mesma. “Em São Vicente entramos com uma ação civil pública e ganhamos uma liminar para o estado instalar equipe mínima de saúde, mas isso não aconteceu e estão devendo R$ 1 milhão de multa. Realmente não há uma preocupação com a situação da saúde dos presos”, disse.
Em todas as unidades visitadas também não havia nenhum laudo da Defesa Civil, Corpo de Bombeiros e Vigilância Sanitária. “A primeira vez que me apresentaram um laudo foi na semana passada em uma visita em Mogi das Cruzes. Em 2013 fizemos um levantamento e 80% das unidades não tinham sido inspecionadas sequer pelo Corpo de Bombeiros ou Defesa Civil”, explicou o defensor.
Entrevista com Bruno Shimizu, Defensor Público:
DIÁRIO_ O que mais te chamou atenção nas causas mortes dos presos?
Bruno Shimizu_ O número de mortes indeterminadas é um absurdo. Isso indica que nem sequer a um diagnostico aquele preso teve direito. Esse número de mortes é praticamente um genocídio.
Por que a situação da saúde dos presos é tão delicada?
É uma população muito doente e qualquer doença é  rapidamente  transmissível. É muito comum ter surtos de piolho a tuberculose. Os presos relatam que só recebem atendimento quando fazem escândalos ou estão morrendo. Em alguns lugares onde conseguimos colocar equipes de saúde, conforme a lei manda, a situação melhorou bastante.
Como deveriam ser as equipes de saúdes?
As equipes básicas são compostas por médicos, auxiliares e técnicos de enfermagem, enfermeiros, assistentes sociais, dentistas e psicólogos. Porém, só temos 33 lugares com essas equipes . Em muitos presídios não há sequer médicos e o atendimento é externo. Isso também é um absurdo porque necessita-se de escolta e há vários relatos de casos em que a escolta da PM (interior) e de agentes da SAP (capital) demoram para chegar ou então escolhem quem vão levar. Os presos são deixados para morrer. Se sobreviver ótimo, se morrer melhor ainda.
Depoimento:
Filha de um detento de 76 anos
Precisamos pagar um médico
Meu pai tem uma doença  chamada policitemia vera, que produz muito sangue. Todo mês é preciso retirar uma quantidade de sangue do corpo e se isso não for feito, pode haver um entupimento das veias,  provocar um AVC e morrer. Nossa luta para ele ter direito a fazer esse procedimento começou em 2012, quando foi preso.  Durante quatro anos ele não fez esse procedimento e só está fazendo há seis meses porque entramos com um pedido de prisão domicilar e tivemos que pagar um médico para poder consultá-lo dentro da penitenciária. Ele ficou internado por duas vezes e numa delas minha família tinha certeza de que não iria sobreviver. O médico nos disse que não sabe como ele está vivo.  Pediu vários exames e ainda faltam alguns para fazer. Colocaram meu pai na enfermaria e agora ele está convivendo com vários doentes, sendo que precisa apenas de sangrias mensais. Quando ele faz esse procedimento fica com a imunidade baixa. Só deram atenção para ele porque pagamos o médico. É desumano o tratamento.  O estado cria um sistema, mas não oferece a mínima condição de funcionamento.
Em três anos, unidades tiveram quase nove mil presos com tuberculose
Celas superlotadas e com pequenas janelas para entrada do ar. O cenário é propício para o contágio de doenças, como a tuberculose. Segundo dados obtidos pelo DIÁRIO por meio da Lei de Acesso à Informação, nos últimos três anos, o sistema prisional no estado teve 8.538 casos.
Um dos principais meios da transmissão da tuberculose é pelo ar. Em 2015 foram 3.157 doentes, sendo que esse número é maior do que 2014, com 2.838 detentos com o problema, e 2013, com 2.543. Segundo médicos ouvidos pela reportagem, a estatística é alarmante.
De acordo com o médico José Gustavo Barian, pneumologista do Hospital Edmundo Vasconcelos, na Zona Sul da capital, as condições inapropriadas de higiene tornam os detentos mais vulneráveis à doença.
“A prevalência da tuberculose nas penitenciárias costuma chegar a valores dezenas de vezes maiores dos que os da população em geral. Isso se deve, principalmente, à superlotação, à insalubridade e às condições de higiene”, afirmou.
O médico pneumologista Rodrigo José Castioni Santiago disse que após o preso ser diagnosticado, ele tem de ficar isolado. “Algumas pessoas têm  imunidade baixa e facilitam a contaminação. Esse dado é alarmante”, disse.
Barian explicou que uma forma de prevenção da doença é tentar reduzir a superlotação, melhorar a higiene e aumentar a vigilância em outros presos. “É preciso assegurar tratamento adequado. No Brasil, em 2014, tivemos uma incidência de 33 casos novos de tuberculose a cada 100 mil habitantes. Se compararmos estes dados com os da população carcerária de São Paulo de 2015 são 3.157 doentes para 109 mil detentos, um número cerca de 80 vezes maior”, explicou.
RESPOSTA DA SECRETARIA:
Investimentos em presídios
A SAP (Sistema de Administração Penitenciária) disse que muitos detentos, quando dão entrada nos presídios, são portadores da tuberculose e são medicados e tratados. A nota disse que o número de presos mortos em presídios do estado diminuiu entre 2014 e 2015. “A Pasta investe na modernização e ampliação da infraestrutura do sistema prisional paulista, com a inauguração de 20 novos presídios e outros 19 estão em construção. Todos os presos possuem colchão, roupa de cama, vestuário e produtos de higiene. Não procede a denúncia de que há falta de remédios. Todavia, caso seja prescrito algum medicamento não constante nas unidades, é solicitada compra. Os reeducandos têm atendimento garantido por meio da equipe de saúde nas unidades. Os casos mais complexos são encaminhados à rede pública de saúde ou ao Centro Hospitalar do Sistema Penitenciário da Fundação ABC.  Atualmente foi autorizado concurso para contratação de  252 médicos, As áreas de saúde dos CDPs de Suzano, Praia Grande e São Vicente foram reformadas. Todas as celas das enfermarias dispõem de chuveiros com água quente.
FONTE: diariosp.com.br

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